Só conseguia correr, seu coração batia mais rápido que qualquer coisa que podia se imaginar, como se fosse pular do seu peito. Já estava sem rumo, passava por ruas, becos e vielas escuras jamais vistos. Esquerda, direita ou frente, não havia mais diferença. O sangue quase em ebulição não deixava sentir a garganta seca e o arder da pele.
E corria. Na sua fuga alucinada olhava pra trás várias vezes para ver se estava por perto. Quando diminuiu o passo, foi atordoado por um grito longo e desesperado. Então voltou a correr, ainda mais rápido. Estava sendo alcançado, vinha com passos longos e tão rápidos quantos os seus. Ao olhar mais uma vez, o viu de perto. Tinha braços longos e um pescoço curto. Não havia face. Sem olhos, nariz ou boca. Mas via, sentia e gritava, gritava muito. O corpo magro e negro, quase uma sombra causando horror por onde passava.
Grades e muros altos, onde arranhou os braços diversas vezes quando corria, onde gatos pretos chorando para a lua davam ainda mais o toque de filme de terror, naquela noite onde vultos passavam e se perdiam diante dos olhos.
Continuava correndo, até não aguentar mais. Tomado pela exaustão, sentiu cinco dedos atravessando suas costas. Seguida de um grito apavorante, a mão rasgava sua pele e apertava seu peito. Já se engasgava com o sangue que subia pela garganta e aceitava o fim. Ao segundo golpe, ambos gritaram. Um assombroso tom de comemoração abafava o de uma dor agonizante. Ao terceiro golpe, viu uma luz branca tomar sua visão e tudo ao redor.
São oito da manhã. Atravessando a janela, os raios solares atingiam seu rosto. Acordou em sua cama chorando, suado e completamente sem fôlego. Sentia as pernas queimando e o peito doendo.
Ainda respirando fundo, olhou para a janela e sorriu. Chegou a conclusão que estava na hora de parar com os filmes antes de dormir.